A hora que você acordar, a vida acabou…

Numa manhã comum, dessas que passam despercebidas pela rotina. O sol entrava pela fresta da cortina, mas não iluminava nada além da poeira que flutuava em silêncio. Na mesa, o café esfriava ao lado do jornal aberto em alguma notícia que ninguém se daria ao trabalho de lembrar no dia seguinte. Parecia que o mundo não fazia questão de nos alertar que o tempo estava se esgotando.

O relógio na parede marcava 7h32. Um tique-taque insistente, quase zombeteiro, lembrava que os ponteiros seguem seu curso, indiferentes ao que fazemos ou deixamos de fazer. Quantas vezes corremos para acompanhar esses ponteiros? E, ironicamente, quantas vezes nos sentamos para assisti-los passar, como se tivéssemos todo o tempo do mundo?

Naquele dia, notei que a vida não avisa quando está prestes a acabar. Não há sinal de trânsito, nem uma contagem regressiva. É apenas o silêncio de sempre, até que, de repente, ela acaba — talvez não literalmente, mas em pequenas partes que nos escapam. A última vez que você viu aquele amigo de infância sem saber que nunca mais se falariam. O último abraço nos seus pais antes de se mudar e nunca mais voltar como o mesmo. A última risada antes de uma discussão boba que separaria mundos.

A brevidade da vida não está apenas no fim; está no meio, escondida nos detalhes que ignoramos. Está no “amanhã eu ligo”, no “depois eu vejo”, no “um dia, quem sabe”. A vida não espera. E a hora que você finalmente acordar para isso, ela já terá passado.

Pensei nisso enquanto lavava a louça e via a água correr pela pia, levando consigo resíduos de algo que foi inteiro, mas que já não existia mais. Era apenas espuma e correnteza, uma metáfora perfeita para a vida: parece longa quando começa, mas desaparece antes que possamos segurá-la.

O relógio agora marcava 7h47. Quinze minutos haviam se esvaído, e eu não sabia o que fazer com eles. O que fazemos com o tempo que nos é dado? Guardamos para quando for conveniente? Ou gastamos de qualquer jeito, como moedas que julgamos ter de sobra?

Talvez a resposta seja mais simples do que pensamos. Talvez seja sobre não esperar o grande momento, a ocasião especial ou o amanhã. Talvez seja sobre a coragem de dizer “eu te amo” sem medo do eco, de perdoar mesmo quando ainda dói, de ligar mesmo quando acha que vai atrapalhar.

A vida, afinal, não é uma sequência de começos e fins, mas de presenças e ausências. Enquanto estamos aqui, somos presença. Quando a hora chega — seja pelo fim literal ou pelas pequenas despedidas ao longo do caminho —, nos tornamos ausência. E o mundo continua girando, indiferente aos nossos dramas pessoais, como o relógio na parede que agora marcava 7h55.

Levantei-me, desliguei o relógio e abri a janela. O ar fresco entrou e, com ele, a sensação de que o tempo não pode ser parado, mas pode ser vivido. Não há como impedir que a vida acabe, mas há como fazer com que cada instante importe.

Porque, no fundo, a hora que você acordar para a brevidade da vida, ela terá acabado — ou começado, se você souber o que fazer com ela.