A Pequenez de existir

Um texto foi com o coração de uma mãe

Renata Canales*

O universo, em seu infinito, aconchega o tempo, o espaço, as galáxias, as estrelas, a escuridão, o sol. Como pai cuidadoso tenta manter em ordem e harmonia todos os filhos que abraça. Dentro dele, uma de suas galáxias abriga a Terra habitada por humanos, plantas, animais. Nesta casa enorme, azul como já foi descrito, continentes se delineiam com seus países, mares, rios, ilhas. Em cada um deles, vidas nascem e morrem sem que a ciência ainda tenha provado para onde vão estas energias que já foram reais juntamente com as nossas palavras, nossos choros, nossas risadas. Em que lugar deste imenso universo continuam a existir, de forma transformada, de forma que nem se sabe qual é, onde vivem ou revivem, ou não existem mesmo com existência? Existências verdadeiras que permanecem vivas em nós que sentimos suas faltas.

Hoje acordei pensando, como em muitos outros dias já pensei: por que estou aqui, como me identifico nesta inquietude? Ao nos apresentar a alguém que ainda não conhecemos, parece-nos normal nos definirmos na nossa profissão, idade, família ou posses. Mas como de fato posso me mostrar e dizer quem sou? Jornalista? Filha do Dito Carlos? Mestra em educação? Especialista em mídias digitais? Escritora? Nesse embolado de tudo que construímos, que ao longo dos anos a cada dia estudamos, trabalhamos, conversamos, sempre pensei que o mais que me definia é ser mãe. Nesta imensidão em que nos cabe um lugar para dormir, para cozinhar, que chamamos de lar, nesse pequeno espaço é que descobri a minha razão em estar aqui. Foi na dor do parto, na hora em que tive meu filho ainda melado da placenta nos meus braços, na hora que o peito inchado de leite era alimento para ele, que eu soube a conexão que havia entre mim e esse universo pai.
Tudo fez sentido para a exigência de coragem na vida, para o conhecimento adquirido que tanto ainda tinha que crescer, o amor pelo outro que me estenderia seu coração para sempre. Não foi o sentimento de um amor egoísta, pelo contrário, o amor era direcionado a todos os seres vivos e aos chamados inanimados da natureza.

Foi com o meu filho em meus braços ainda bebê e depois de mãos dadas a ele já adulto que a vida fez sentido! Quando meu filho foi levado para outro espaço do universo, a sensação de falta de chão, de solidão, de pequenez diante a tudo que antes parecia me pertencer, me deixou sem saber quem eu era. Como a partir daquele instante eu me apresentaria a alguém? Sou… não sei; sou… aquela que não; sou… era.

Os anos passaram e me encontro ainda sem chão estável, mas começando a me identificar novamente. Afinal, eu sou a mãe do Rodrigo e isso ninguém pode me tirar.
Minha solidariedade, meu coração, minhas orações aos pais dos dez meninos mortos no alojamento do Flamengo, meninos que sonhavam em conquistar o universo e que por descaso de poderosos estão agora nesse lugar que não sei dizer onde é, junto com meu filho, também amante do futebol. Que vocês joguem muita bola e saibam que nós, neste pedacinho que estamos, sempre pensaremos em vocês.

Renata Canales é jornalista e proprietária da Zéfiro Comunicação