Por Glauco Keller
Não se sabe exatamente quando o homem começou a escrever. Cientistas já encontraram marcações em cavernas que datam de aproximadamente 40.000 atrás. A escrita sistematizada, tal qual conhecemos hoje, apareceu, contudo, há aproximadamente 5.000 anos.
A linguagem oral e, posteriormente, a escrita, possibilitou ao Homo Sapiens que se diferenciasse dos outros animais ao passar aos seus descentes algo além do biológico: a cultura. Hábitos, crenças, culinária, línguas e formas de pensar e enxergar o mundo passaram a caminhar de geração para geração.
O nascimento da escola tal qual conhecemos hoje fez com que o conhecimento acadêmico acumulado pela humanidade pudesse ser transmitido aos mais jovens e fosse mantido em livros e apostilas. Não fosse assim, cada nova geração teria de redescobrir o fogo, criar a roda e aprender a levantar sua casa sozinho para se proteger dos animais mais fortes e rápidos. Foi a cultura que deu ao homem a possibilidade do trabalho colaborativo para nos manter vivos.
Mas, será que atualmente escrevemos menos e será que isso irá pôr em risco a nossa transmissão cultural?
A preocupação com a falta da manuscrita é algo comum nas reuniões de pais e mestres de que participo nas mais variadas escolas. Meu filho não tem anotações no caderno! Minha filha não escreve nada.
É verdade! Porém também é verdade que as tecnologias mudam geracionalmente e, aparentemente, de maneira exponencial após as revoluções industriais. Isso significa que é bastante racional pensar que em algumas gerações não estaremos mais manuscrevendo como já pouco fazemos hoje. A escola tornou-se uma ilha que, embora taxada de doutrinadora e excessivamente progressista, é, por vezes, a grande conservadora de hábitos e costumes das gerações anteriores. Onde, se não na escola, discute-se e comemora-se o folclore brasileiro? Onde, se não na escola, apresenta-se aos alunos um resumo crítico do Estado Novo, da Ditadura Militar e da Redemocratização do país? E, onde, fora da escola, nós, enquanto seres humanos, somos obrigados a manuscrever? Em nenhum lugar. Esta crônica, por exemplo, está sendo digitada em um documento do word. Você, caro leitor ou cara leitora, diante da necessidade de se comunicar com alguém, digita no aplicativo de mensagens, quando não, por preguiça, grava uma mensagem. Ou estou errado? Quem manda cartas manuscritas nos dias de hoje? Mas, ironicamente, os pais querem que os filhos e filhas os façam.
Isso significa que estamos perdendo nossa cultura? Claro que não. Apenas estamos mudando a forma de transmiti-la. Você, honestamente, imagina uma sociedade qualquer daqui a cem anos usando um objeto de madeira com um pedaço de grafite enfiado no meio e que é chamado de lápis? Logicamente que não.
Desta forma, lutar contra o uso do celular, da câmera e de qualquer tela, em geral, é lutar contra o futuro. É lutar uma guerra perdida. Assim, fizeram os críticos da máquina de escrever, da energia elétrica e do telefone.
A grande luta que temos de travar é nos adaptar mais rapidamente à nova tecnologia para que não nos tornemos obsoletos. A luta a ser lutada é para atingir um uso consciente e responsável e igualitário das novas tecnologias. Em breve, as escolas estarão alfabetizando as crianças usando teclados e não lápis. É um fato inexorável e indiscutível. Olhar para o passado de maneira nostálgica é uma forma ingênua de achar que o mundo era melhor há dez, vinte ou cinquenta anos. Os conservadores são crianças mimadas que não querem que o mundo mude, porque assim o conhecem. Assim ocorre nas artes, nas religiões, na sociedade e na política. Ponto. Ah! e por falar em política, dia 30 podemos nos manter usando o lápis do atual governo ou passar a usar o celular do futuro.
Foto: Infoenem