
Há histórias que nascem do medo, e outras que parecem brotar do próprio chão frio do cemitério. Esta é uma daquelas que São Carlos sussurra de boca em boca, especialmente na última semana de outubro, quando o vento sopra estranho e o nevoeiro cobre a Avenida São Carlos, na altura do Cemitério Nossa Senhora do Carmo.
Dizem que, todas as noites, entre os dias 28 e 31 de outubro, um homem aparece à beira da estrada, bem em frente ao portão principal, logo ao lado do velório municipal. Ele parece perdido, com um terno antigo, o rosto pálido demais para ser vivo e os olhos fundos como quem carrega séculos de insônia. Levanta a mão pedindo carona, num gesto lento, quase cerimonial.
Os motoristas que passam juram que ele fala pouco — apenas diz o destino:
“Me deixe até a Washington Luís.”
O trecho é curto, não leva nem dez minutos. Mas quem aceita o pedido nunca chega ao trevo.
No dia seguinte, o carro é encontrado parado no acostamento, motor ligado, faróis acesos, e o motorista… vazio. O corpo está lá, mas os olhos — dizem — não enxergam mais nada deste mundo. A alma, dizem os antigos, foi tomada pelo Homem do Carmo, como ficou conhecido. Dizem que isso começou nos anos 50…
Reza a lenda que ele foi um viajante que morreu em um acidente na década de 1960, quando o velório ainda era pequeno e o cemitério terminava pela metade. Voltava para casa, cansado, e ninguém parou para ajudá-lo naquela noite fria. Desde então, na semana do Halloween, ele volta para buscar companhia — uma por ano, até completar o número dos que o abandonaram à própria sorte.
Moradores próximos afirmam que, à meia-noite, é possível ver o vulto parado na esquina da Praça da Independência, iluminado pela luz mortiça dos postes, fitando os carros que sobem a avenida, ele não é um pedinte, um usuário de drogas, seu ar é diferente. E quem ousa encarar seu olhar pelo retrovisor garante que ele sorri antes de desaparecer — um sorriso torto, úmido, e sem alma. Motoristas de aplicativo, alguns já viram…
Por isso, todo são-carlense que se preze evita dar carona nas noites entre 28 e 31 de outubro. Dizem que, se você parar, ele entra sem abrir a porta. Se tentar falar, a voz falha. E quando chegar ao fim da avenida… já será tarde demais.
Ninguém sabe se é lenda ou verdade. Mas nesta cidade, onde o vento parece sussurrar nomes entre as lápides, há quem jure que o Homem do Cemitério Nossa Senhora do Carmo ainda caminha por ali — esperando a próxima alma que o leve até a saída da cidade.
Essa é uma lenda contada por antigos são-carlenses.







