Marcio Iroldi: Alma e Coração de Bombeiro!

Bombeiro de alma e coração

Por Renato Chimirri

Gravação de Maurício Duch

Imagens: Maurício Duch, Fábio Maurício e Divulgação

 

Sabe aquela pessoa que você pode definir como “do bem”? Pois é, ela existe e está mais perto do são-carlense do que ele pode imaginar. Sempre com um sorriso, sério quando precisa, afinal a profissão é duríssima, mas com um carinho com seus, digamos, “atendidos” que é evidente nas ocorrências, falamos do Cabo PM do Corpo de Bombeiros de São Carlos, Marcio Iroldi. Antes de ser Bombeiro, Iroldi é um homem que irradia bondade e contagia a todos que estão à sua volta.

Nessa entrevista ao São Carlos em Rede, Marcio Iroldi, abriu o coração e contou um pouco sobre sua atuação e experiência de vida, algo que pode servir de exemplo para muitos jovens nos dias atuais. Acompanhe os principais trechos da entrevista:

 

São Carlos em Rede- Como você descobriu que queria ser Bombeiro?

Marcio Iroldi– Ah, desde criança! No passado assistia a TV Globinho e tinha um desenho que era de um dragão que queria ser Bombeiro (o desenho se chamava Dragueto e o editor do site também assistia!). Você já imaginou um dragão querendo ser Bombeiro? É impossível, cara! Tenho essa frase na cabeça: “quando crescer quero saber Bombeiro!” Mas não acho esse desenho e isso ficou, quando tive a oportunidade de prestar não abriu para Bombeiro, apenas para Polícia Militar.

 

São Carlos em Rede- Você prestou o concurso para a Polícia Militar então?

Marcio Iroldi- Prestei para a Polícia Militar e fiquei sete anos e os caras me mandaram para os Bombeiros. Modéstia à parte, eu era um bom policial, trabalhava em todos os bairros, muitas ocorrências em regiões do Cidade Aracy, Antenor Garcia e surgiu a oportunidade, havia feito a papelada e acabei mandado para os Bombeiros. Graças a Deus hoje estou nos Bombeiros, deu tudo certo. À época o comandante era o Coronel Dus e ele não deixava eu ir para os Bombeiros, pois fazíamos o policiamento comunitário no Aracy e essa era a menina dos olhos do governador. Mas por ajuda de Deus, saiu uma papelada, e o Coronel Dus me ajudou a vir para cá. Cheguei aos Bombeiros em 2002.

 

São Carlos em Rede- Ser Bombeiro nos dias de hoje é mais fácil ou mais difícil, se comparado com o início de sua carreira?

Marcio Iroldi- Eu acho que é mais fácil, porque hoje temos muito mais tecnologia. Por exemplo, em Ribeirão Preto, São Paulo, existe uma câmera térmica, então tudo mudou, para se desencarcerar e etc. Infelizmente, os Bombeiros dependem muito de Prefeituras de uma forma geral então de um prefeito para o outro o investimento as vezes não é o mesmo. Daí você sofre com viatura, material, contudo o gosto e a vontade são os mesmos. Bombeiro não é profissão, é sacerdócio. Hoje acho mais fácil trabalhar, quem influencia muito os Bombeiros no Brasil são os americanos, em termos de caminhão e etc, eles são o “top do top”, assim como os alemães são muitos bons. Todavia, o Bombeiro do Estado de SP tem uma diferença, ele faz tudo, é polivalente: atende incêndio, mergulho, altura. Em outros locais é separado, atende-se incêndio e outras ocorrências, alguns  são apenas paramédicos, por isso digo que o Bombeiro do Estado de SP é um dos melhores do mundo. Hoje acho muito mais fácil, mas percebo que a meninada de hoje segura um pouco mais, não sei se é a formação, as vezes a Rose até me puxa a orelha e estou sempre indo para cima. Outro dia num incêndio parei com o Resgate e entrei sem água, sem nada, para procurar botijão, ver se tinha vítimas, é isso que as vezes falta na molecada. Acredito que a escola faz isso para meninada não morrer, eles tem que saber o  que estão fazendo. Nós vamos bastante na base da coragem e da bravura. Acabei levando choque (Marcio Iroldi levou um choque grave quando atendia um atendimento numa construção no Centro de São Carlos) porque subi, olhei a situação e acabo sempre indo para a cima nas ocorrências. Virei vítima porque o local estava todo errado, se você bobear a situação foge do controle. Você não tem como parar para analisar, e naquele momento tomei uma decisão necessária e acabei me dando mal por causa do lugar não ter segurança.

São Carlos em Rede- Qual o caso que você atuou e que mais lhe marcou no Corpo de Bombeiros?

Marcio Iroldi- Eu acho que foi a ocorrência na estrada no trevo de Brotas, num pedacinho da Washington Luís que vira no sentido dessa cidade. Um carro estava cheio e um homem colocou criança na parte debaixo do automóvel, no chão, na frente. Tinha um pessoal atrás, a mãe estava segurando uma criança e ela segurando uma Minnie de pelúcia. Acho que o motorista cochilou, e eles entraram embaixo de um caminhão. O único que sobreviveu foi o menino que estava embaixo, porque o motorista entrou, bateu e todos morreram. Tiramos o menino vivo, mas a mãe morreu abraçada com a criança e a pequena morreu abraçada com o bichinho de pelúcia. A menina parecia muito com a minha filha e aquilo ficou na cabeça, enquanto não cheguei em casa, sozinho, e chorei, aquilo não saiu. Isso me marcou demais. Eu brinco também, quando foi meu batizado, tinha vindo da PM e foi a primeira ocorrência trabalhosa que peguei: uma mulher estava na SP 215 que vai de São Carlos para Jaú e bateu de frente num caminhão, quando vi o pessoal tava mastigando e pensei o que seria, e notei que o carro transportava um ovo de Páscoa que se esfacelou e ficou partido na estrada, o pessoal estava ali, trabalhando, com fome, acabaram comendo aquele chocolate: “Pensei! Nunca mais como chocolate!”. A coisa foi longa, o pessoal estava com fome, mas hoje eu comeria o chocolate.

 

São Carlos em Rede- Os Bombeiros são muito admirados pelas crianças. Qual a sensação de ver um pequeno querendo subir no caminhão e dar uma volta com seus heróis?

Marcio Iroldi- Eu acho que não tem preço. Me preocupo muito com isso. Todo mundo que vem perguntar sobre como faz para ser Bombeiro e eu digo para ir atrás do seu sonho. Às vezes eu sei que a pessoa não pode ser, por causa do porte físico, do tamanho, mas eu sempre encorajo, porque não tenho o direito de acabar com o sonho de ninguém. Toda a criança que vai ao quartel sempre recebe grande atenção, coloco roupa, vou tentar dar uma volta ali com ela. Falo por mim, prefiro que alguém tenha um sonho, sou um agraciado, pois meu sonho de criança era ser Bombeiro, não tem coisa melhor que realizar o que você quer, se todo mundo que for ali conseguir aquilo que deseja, posso dizer que já ganhei meu dia. A pessoa precisa entender os seus limites, ter o entendimento de até onde ela pode chegar, nós que nos arriscamos podemos nos machucar como aconteceu comigo, aquilo era algo necessário. Quando você ia imaginar que uma rede de proteção estaria com arame, que bateria numa alta e lhe pegaria em cima de um muro? Foi uma fatalidade, mas se é um leigo, e ele vai tentar resolver e toma um choque, certamente a pessoa estará enrolada.

 

São Carlos em Rede- Você foi vítima de um acidente grave, um choque elétrico. Qual a experiência tirada dessa provação que a sua vida passou?

Marcio Iroldi– Foi uma chance que Deus me deu, porque era para eu ter morrido e não escapado. Vejo assim, todo o bem que eu fiz, “que depositei naquela conta”, acho que veio algo assim: “Bom, ele ajudou muita gente, vou dar uma colher de chá para esse cara!” Não perdi a mão, não perdi o pé, era para eu ter várias sequelas e estou trabalhando, fui agraciado, acho que estava com bônus. Gastei tudo o que tinha, agora preciso acumular novamente, ajudando mais pessoas.

 

São Carlos em Rede- Quem é o Marcio Iroldi fora do Corpo de Bombeiros?

Marcio Iroldi– O Marcio Iroldi é um cara caseiro e que agora ajuda a esposa num laboratório de prótese. Mas o Marcio Iroldi é aquele cara que tudo acontece perto dele. Sobra pra mim empurrar o carro, ajudar o cara que caiu. Para você ter uma ideia, eu fui para Roma com minha esposa e lá na Capela Sistina uma pessoa passou mal, você acredita? Eu tava lá socorrendo o cara, um italiano, minha mulher perguntou: “Cadê ele?” Estava ajudando. Na Crisma da minha enteada o Bispo passou mal, tenho aquele imã, mas eu sempre ajudo.

 

São Carlos em Rede- Qual a mensagem que você deixa para as crianças que pretendem seguir a profissão de Bombeiro?

Marcio Iroldi– Seguir com amor à profissão é ótimo. Espero que estude, se eu tivesse a oportunidade de ter estudado mais, feito a academia do Barro Branco e me tornado um oficial, mas infelizmente tenho um filho com necessidades especiais do meu primeiro casamento, por isso me dediquei a ele, não pude correr atrás da minha carreira. Sempre digo para correr atrás dos seus sonhos, se você pensa que quer ser Bombeiro, mas acaba seguindo a carreira de médico porque vai ganhar mais, é melhor ser um Bombeiro e ganhar mais ou menos do que um médico ruim. É uma profissão nobre e muito perigosa. Já tomei facada em ocorrência de um menino que tentava se matar, daí fui para cima, tomei o choque, cortando árvore cai e esmaguei vértebra, é uma profissão perigosa, mas é gratificante quem está ali, é porque ama a profissão. Se você nasceu para ser padre, será padre, o mesmo ocorre com os Bombeiros. Eu dou a maior força para quem quiser seguir na profissão. Deus que ajude e que a pessoa estude e cresça na carreira.