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O cemitério clandestino entre a Redenção e o Boa Vista

Entre os bairros Boa Vista e Redenção, em São Carlos, havia um cemitério que o tempo parecia ter apagado da memória dos vivos. Ninguém sabia ao certo quando ele havia sido abandonado, mas as lápides desgastadas e os muros rachados contavam histórias de décadas, talvez séculos. A vegetação havia tomado conta, enroscando-se nas cruzes de ferro e engolindo os túmulos em um abraço sufocante de hera e musgo. O silêncio era denso, quase palpável, como se o ar carregasse o peso das almas que ali repousavam.

Por anos, o cemitério foi ignorado. Os moradores dos bairros vizinhos passavam rapidamente pela rua estreita que o margeava, evitando olhar para o portão enferrujado que rangia ao menor sopro de vento. Diziam que o lugar era mal-assombrado, mas eram apenas histórias, contos para assustar crianças curiosas. Até que, em uma noite de lua cheia, algo mudou.

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As primeiras luzes apareceram como vagalumes errantes, flutuando entre as árvores. Quem as viu de longe pensou ser apenas um reflexo da lua nas folhas molhadas. Mas as luzes não desapareciam. Elas dançavam, formando padrões estranhos, como se tentassem comunicar algo. Logo, os sons começaram: sussurros que ecoavam entre as lápides, risadas baixas que pareciam vir de todos os lados e de lugar nenhum ao mesmo tempo. E, às vezes, o som de passos arrastados, como se alguém caminhasse sobre as folhas secas.

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Uma menina chamada Clara foi a primeira a se aproximar. Curiosa e destemida, ela escalou o muro baixo e entrou no cemitério, atraída pelas luzes. O que ela viu lá dentro nunca contou a ninguém, mas, quando voltou, seus olhos estavam vidrados, e ela murmurava palavras em uma língua que ninguém reconhecia. Dias depois, desapareceu sem deixar vestígios.

A partir daí, o cemitério começou a se manifestar de formas cada vez mais perturbadoras. Moradores relatavam ver vultos nos becos próximos, sombras que se moviam contra as paredes das casas. Animais evitavam a área, e os pássaros pareciam voar em círculos acima do cemitério, como se estivessem presos em uma armadilha invisível. À noite, o portão enferrujado começou a se abrir e fechar sozinho, rangendo como um lamento.

Uma noite, um grupo de jovens decidiu investigar. Armados com lanternas e câmeras, eles entraram no cemitério, determinados a desvendar o mistério. O ar estava gelado, apesar do calor do verão, e a sensação de ser observado era constante. As luzes reapareceram, mas desta vez eram mais intensas, quase cegantes. Os sussurros se transformaram em gritos, e os jovens correram em pânico, deixando para trás equipamentos e um dos seus, que nunca mais foi visto.

Com o tempo, o cemitério começou a se expandir. As árvores que o cercavam cresceram de forma anormal, suas raízes quebrando calçadas e invadindo quintais. As lápides começaram a aparecer em lugares estranhos, como se o cemitério estivesse se espalhando para além de seus limites. Os moradores dos bairros próximos começaram a se mudar, deixando casas abandonadas que rapidamente eram tomadas pela vegetação e pela escuridão.

Hoje, o cemitério entre Boa Vista e Redenção é um enigma no mapa de São Carlos. Ninguém se atreve a se aproximar, e aqueles que o fazem nunca voltam. Dizem que as luzes ainda dançam entre as árvores, que os sussurros ainda ecoam nas noites de lua cheia. E, às vezes, em meio ao silêncio, ouve-se o som de um portão rangendo, como se algo—ou alguém—estivesse tentando sair.

Esta é uma obra de ficção.

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